1. Voltando para casa
O sol estava se pondo, numa linda mistura de azuis e lilases sob nuvens douradas. Um fim de tarde perfeito. Faziam 24°C em Greysville, a cidade minúscula onde eu estava estudando. Eu vestia jeans, tênis e camisa branca. Estava com minha mochila de viagem, pois a bagagem já havia sido despachada uns dias antes, para a fria e nebulosa Alvorada, minha terra natal.
- Faça uma boa viagem. – a Diretora Carla viera me acompanhar até o aeroporto, junto com minha amiga Vivian.
- Não esqueça de ligar e me mandar e-mails contando tudo!
- Claro, Vivi. Vou escrever sempre! - Nos abraçamos, bem forte. Vivi era minha melhor amiga, nestes sete anos de internato.
- E tome cuidado, você sabe como tudo está perigoso hoje em dia, Lara.
- Sim, pode deixar.
Meu verão havia sido ótimo: Vivi tinha me convidado para ir com ela para a casa de praia da família, num lugar incrivelmente chique e sofisticado, na França. É claro que também passei duas semanas em casa, com meu pai. Depois, voltei para o colégio, ou seja, estava tudo bem, pelo menos até agora.
Na semana passada, bem no meio do ano letivo, meu pai ligou, dizendo que, agora que eu estava no Ensino Médio, seria melhor que eu estudasse na New Hills, a escola privada de primeira classe que ficava em Alvorada, minha cidade natal. O argumento dele era que a instituição era muito bem conceituada e muitos alunos desejavam ter a oportunidade de estudar lá, então, por que não aproveitar a oportunidade? Na verdade, era mais uma ordem do que um convite. Desde que eu havia pego uma gripe, que quase virou pneumonia, de uma colega do colégio meu pai havia ficado meio esquisito, talvez estivesse com medo de perder sua única filha, foi o que pensei. Assim, mesmo entrando na metade do ano, eu estava indo para lá, sem saber o que havia acontecido para que meu pai tivesse essa idéia tão repentina.
- Lara, você viu?
- O que?
- Ai, boba... – ela cochichou no meu ouvido: Aquele gato tá só olhando pra você!
Segui o olhar de Vivian e dei de cara com o garoto mais bonito que eu já havia visto. A primeira coisa que me chamou atenção foram os olhos dele: de um castanho-dourado, e pareciam faiscar. Os cabelos eram louro-escuro, curtos, ele era alto, devia ter 1,80. Eu já havia conhecido misses e modelos internacionais, em jantares na casa de meu avô, mas ele tinha alguma coisa diferente, difícil de explicar ou definir o que era. Eu poderia dizer que era uma presença, um porte elegante, eu diria nobre, até.
Nossos olhos se encontraram por não mais do que alguns segundos, mas eu senti uma espécie de familiaridade, parecia que nos conhecíamos há muito tempo. Eu desviei o olhar, corando em seguida.
- Eh, vê se aproveita bem essa viagem...- Ela coxixou no meu ouvido.
- Até parece que você não me conhece, Vivi...
- Por isso mesmo, se ele tá a fim vai vir falar com você...
- Eu duvido.
Ouvi a última chamada para o meu vôo, abracei Vivi e a diretora mais uma vez e rumei para o portão de embarque. Acenei pela última vez e embarquei, e ainda pude ver Vivian sorrir e piscar o olho maliciosamente para mim.
2. Vôo
Da janela do avião eu olhava enquanto as construções iam ficando cada vez menores e a noite ia se aproximando mansamente no horizonte.
Depois que o aviso de apertar os cintos foi desligado a comissária veio me oferecer fones de ouvido, pois um filme seria exibido. Recusei educadamente. Eu preferia ler um livro. Mostrei a capa de meu livro à ela: O Pequeno Príncipe de Antoine de Saint-Exupéry. Ela sorriu e se retirou.
Eu estava sentada numa das últimas poltronas, mas eu estava sentindo alguma coisa estranha. Dei uma olhada em volta: haviam poucas pessoas na primeira classe. Foi aí que eu senti aqueles olhos. Sim, senti é a palavra certa porque foi muito mais do que ver, era como se eu soubesse que ele estava ali antes mesmo que meus olhos pudessem vê-lo. Ajeitei-me rápido na poltrona. Será que ele havia me visto?
O filme estava começando e a luz foi baixando. A maioria dos passageiros (umas sete ou oito pessoas) estava atenta aos créditos iniciais do filme. A comissária, Marta, vinha sorrindo pelo corredor.
- Não se importaria se alguém ocupasse este lugar, querida?
- Não. – Eu tinha uma séria dificuldade de negar quando alguém me pedia um favor, Vivi dizia que isso era um defeito/qualidade muito grave em mim. Várias colegas costumavam se aproveitar disso e muitas vezes eu acabava me metendo em problemas por conta disso.
Marta deu um passo para o lado, dando espaço para que a pessoa que vinha atrás dela pudesse passar.
“Ok, é agora que eu vou ter um enfarte.”
Do meu lado estava sentado o ser humano mais lindo que eu já havia visto: o garoto do embarque.
Dei um comando mental ao meu rosto: fecha a boca! Vai parecer uma idiota! Sorria! Pareça normal!
- Se precisarem de alguma coisa é só chamar. Boa viagem! – Marta foi saindo de fininho, eu já a imaginava dando gargalhadas atrás daquela maldita cortininha. Ai, se eu pego essa mulher!
- Obrigada, por ceder seu lugar. Eu não queria ver o filme e a comissária sugeriu que eu trocasse de lugar.
Aquela voz macia não era real. Isso só podia ser um sonho. Ou no meu caso, um pesadelo. Sim, o que mais se poderia esperar de alguém naturalmente tímida e que ainda por cima estudava num internato de freiras?
- Ah, eu também não vou ver o filme. Queria terminar de ler um livro. – Mostrei a ele a capa, que sorriu, divertido.
- Hum, é um bom livro... – Ele mostrou o livro dele: era o mesmo livro, apenas uma edição mais antiga.
- Você tem bom gosto. – Sorri, encabulada.
- E você também. – Ele sorriu. Isso não era justo. O sorriso dele era devastador, combinado com aqueles olhos dourados então...
Corei fortemente e baixei os olhos, sem saber o que dizer. Folheei as páginas até encontrar onde havia parado a leitura.
- Gosta de ler?
- É uma boa forma de passar o tempo... – Meu sorriso se tornou amargurado.
- Não gostou do livro?
- Não, não é isso... – Me obriguei a levantar os olhos e olhá-lo no rosto para responder.
- É uma história muito longa.
- Temos tempo.
- Foi um presente de minha mãe. Ela morreu há muito tempo, num acidente. Esse livro me traz algumas recordações tristes... – senti um nó na garganta.
- Por que o lê, então? – Ele parecia fascinado com minha história.
- Nem todas as recordações que tenho do livro são tristes... Lembro que ela o lia para mim todas as noites. Eu sempre pedia para ela fazer os desenhos do livro... – ele tinha uma expressão séria, compenetrada.
- Acho que não me apresentei, sou Richard. – Ele estendeu sua mão cor de marfim.
- Lara. – Nossas mãos se tocaram, havia algo diferente nisso. Sua pele era fria, como metal em contraste com a minha. Senti o toque aveludado durar mais que o normal para um cumprimento, mas fiquei triste quando afastamos as mãos.
- Então, Lara... Viajando a passeio?
- Na verdade, estou indo para casa. Eu estudava num internato e agora vou voltar a morar com meu pai. – Não consegui esconder nada dele, a sinceridade me pareceu tão natural ao falar com ele quanto respirar. – E você?
- Estava resolvendo alguns negócios antigos e agora posso ir para casa. – Senti um certo alívio em sua voz. – O que mais gosta de ler?
- Leio praticamente tudo que aparece.
A conversa sobre literatura se estendeu por longos minutos. Nossa afinidade era natural, algo familiar. Eu sentia que o conhecia há muito tempo, embora pudesse jurar nunca tê-lo visto antes de hoje.
Eu tentava memorizar seu sorriso, seus gestos e sua voz macia de tenor enquanto ele contava sobre alguns livros que havia lido, com medo de que isso tudo fosse parte do sonho mais real que eu já tivera.
Mais de uma hora depois meus olhos estranhamente começaram a pesar. Uma sonolência incontrolável foi me dominando, seguida de uma dor de cabeça persistente e latejante.
- Você parece cansada, Lara. – Seus olhos se estreitaram e uma linha de preocupação se formou, desfazendo a perfeição angelical de seu rosto.
- Não sei o que acontece comigo, não costumo dormir em viagens – um bocejo gigante surgiu interrompendo minhas palavras e confundindo minha mente.
- É comum sentir cansaço excessivo em viagens, especialmente nesta, tão longa.
- Eu não estou... – outro bocejo me interrompeu. – Desculpe.
- Não há por que se desculpar... Além do mais, podemos terminar nossa conversa depois, ainda temos várias horas de vôo. – ele fez menção de se levantar e eu protestei.
- Não precisa sair, pode ficar aqui e terminar sua leitura, não vai conseguir fazer isso se voltar para o seu lugar. – Sua presença era tão agradável e reconfortante que eu não podia admitir ficar longe dele, mesmo que estivesse inconsciente.
- Obrigado. Vou tentar não incomodá-la, então.
- Imagina! Tudo que eu preciso são alguns minutos e vou ficar bem, deve ser só uma queda de pressão ou algo assim.
Reclinei a poltrona enquanto observava de soslaio a perfeição do rosto angelical. Richard abriu o livro e recostou-se na poltrona ao meu lado. O que é que estava acontecendo comigo? O ser mais perfeito que eu já havia visto estava sentado bem ali e eu estava passando mal? Se Vivi soubesse eu iria levar uma bronca daquelas....
Meu consolo era que quando abrisse os olhos novamente ele estaria bem ali.
3. Lembranças
Fechei os olhos e acabei adormecendo.
Quando eu tinha dez anos, minha mãe, Helena Wolff, morreu num acidente de carro, numa estrada próxima à nossa casa. Aparentemente, foi um acidente causado pelo forte nevoeiro da região. Uma das coisas que lembro desta noite é de estar com mamãe na cama, ela mexia no meu cabelo enquanto cantava uma música de ninar para mim. É estranho, porque não lembro de mais nada nem sequer de para onde estávamos indo, mas eu estava lá no carro com ela, quando a polícia chegou. Os médicos disseram que foi um trauma muito forte, e que talvez algum dia eu lembrasse dos eventos daquela noite. Às vezes, me sinto culpada por nem sequer poder lembrar do que aconteceu. Só lembro de estar no hospital, alguns dias depois.
Meu pai, Alexander Wolff, se culpou pela morte dela. Ele achava que se estivesse em casa naquela noite, poderia ter evitado o acidente. Ele mudou muito, ficou mais introspectivo, fala pouco até comigo. Meu pai é médico, cardiologista, e depois do que aconteceu, ele se dedicou completamente ao trabalho e como costumava trabalhar até tarde e ficar muito tempo fora, achou melhor que eu fosse estudar num internato, onde receberia uma educação melhor e teria mais amigos.
Eu sempre venho visitá-lo no natal, nas férias e às vezes ele vinha passar alguns feriados comigo, no colégio. Sempre que penso em meu pai, me vem a imagem de alguém profundamente triste e abatido. Às vezes ele me olha como se tivesse o coração em mil pedaços e me sinto mal, porque todo mundo diz que sou muito parecida com minha mãe, então acho que cada vez que me olha, se lembra dela.
Ultimamente, eu estava tendo pesadelos com minha mãe, de quem meu pai pouco ou quase nada fala. Geralmente, apareciam sombras, que a cercavam, enquanto a luz dela ia ficando fraca, até sumir. No pesadelo, eu sabia que isso significava que ela estava morrendo, mas não tinha forças para impedir. A última coisa que eu via, antes de acordar, eram os olhos dela me olhando e perdendo o brilho, algo realmente assustador.
Na verdade, tenho poucas recordações dela, acho que cabe tudo dentro de uma caixa de sapato: algumas fotos, um cartão de aniversário pelos meus 10 anos e a linda boneca de porcelana, o último presente que eu recebi dela, que tinha os olhos azuis, cabelo castanho e usava um vestido floral, mamãe deu a ela o nome de Nina.
A comissária de bordo tocou meu ombro, pedindo que eu colocasse o cinto de segurança pois em alguns minutos o avião iria pousar. Imediatamente olhei para a poltrona ao lado. Estava vazia. Como é que eu havia dormido tanto? Olhei ao redor procurando Richard, mas não consegui vê-lo. A comissária passou novamente pelo corredor e me pediu para colocar o cinto, o que fiz, a contragosto. Passei a mão pelo meu rosto suado.
Eu devia estar parecendo uma bruxa, a chapinha já era... Será que tudo não havia passado de um sonho?
4. Conexão
Procurei por Richard no desembarque, mas não o encontrei. Parecia que ele havia desaparecido no ar.
Eu ainda precisava pegar uma conexão para Alvorada, seriam mais duas horas de viagem num avião menor. Infelizmente, por causa do gelo na pista as aterrissagens e decolagens estavam atrasadas, meu vôo iria demorar uma hora, talvez mais.
O aeroporto estava cheio, era quase impossível caminhar. Algo estranho aconteceu. Acidentalmente esbarrei em alguém, nem sequer tive tempo de ver quem era. No mesmo instante minha mão começou a arder. Parecia que eu tinha colocado a mão no fogo. Olhei minha mão, estava um pouco vermelha, mas não tinha sinal de arranhão ou outro machucado. Continuei andando e olhei por sobre o ombro, mas não notei ninguém me seguindo. Pensei que deveria ser algum tipo de alergia.
Entrei numa livraria e percebi um homem que me olhava com o canto dos olhos, escolhendo um livro numa das estantes.
Senti um arrepio de medo, quando percebi o modo estranho como ele me olhava. Não era um desses caras esquisitos, na verdade era um sujeito bem vestido, com menos de trinta anos, cabelos escuros, parecia um galã de cinema. Mesmo assim, meu coração disparou.
Escolhi uma revista qualquer sobre fofocas e saí, sentando numa das poltronas da sala de espera, aguardando a liberação da decolagem. E lá estava o tal homem, me observando a uns quinze metros dali.
Eu fiquei feliz por ter algo para ler, e foi o que tentei fazer durante a longa meia hora que se seguiu. Mas era impossível me concentrar com aquele olhar penetrante sob minha pele. Pensei que se parecesse interessada ele não teria coragem de me importunar.
Não tenho porte de modelo, por isso, não tinha a menor chance de que o cara fosse um “olheiro de agência”, já que tenho apenas 1,60. Geralmente, passo despercebida com minha pele dourada pelo sol e cabelos castanho escuros, levemente ondulados e sempre rebeldes.
Percebi que alguém sentou na poltrona ao lado. Continuei de cabeça baixa, tentando parecer interessada na leitura. Era o homem. Tinha uma postura impecável, e pude perceber numa rápida olhada de canto de olho que usava um terno Armani e sapatos caríssimos. Ele me estendeu um cartão de visitas.
- Eu sou Victor Castle, muito prazer.
No mesmo instante em que ele falou um arrepio percorreu meu corpo, como uma intensa descarga elétrica. Sua voz era agradável, confiante, com um leve sotaque estrangeiro e denotava um homem seguro de si. Será que eu deveria conhecê-lo de algum lugar? Ele era alguém famoso?
Todas as recomendações da diretora e do meu pai sobre não falar com estranhos me vieram à mente. Lembrei das histórias terríveis de mulheres que haviam sido dopadas e violentadas.
Eu não sabia o que fazer: e se esse fosse o tipo de cara que fica por aí, perseguindo garotas? Eu não podia ignorar: cada olhar dele me fazia gelar por dentro, embora talvez ainda não tivesse motivo para isso.
Olhei em volta, não havia nem um segurança do aeroporto, parecia que todos haviam evaporado. Ninguém pareceu notar que eu estava em apuros, ou precisando de ajuda. Eu iria adotar minha melhor tática de despistar chatos: responder o mínimo possível, parecendo irritada. Costumava funcionar com garotos, então, por que não tentar com alguém mais velho?
Não respondi, nem aceitei o cartão que ele me estendia. Dei a ele meu melhor olhar zangado.
Ele me fitou por um longo momento, guardou o cartão no bolso e falou novamente. Achei ter visto um reflexo vermelho nos olhos dele, algo assustador. Mas isso só poderia ser imaginação minha afinal, não existem pessoas com olhos vermelhos, existem?
- Seus olhos são muito bonitos. Esse tom de violeta é muito raro, sabia? – Seus olhos felinos se estreitaram, analisando-me. Senti outro arrepio, meu corpo inteiro gritava: perigo, perigo!
- Obrigada. – Lancei-lhe outro olhar congelante.
- Você... Se parece com alguém que eu conheci, há muitos anos atrás...
Baixei a cabeça, querendo parecer obviamente incomodada pela conversa.
Outro longo momento de silêncio se passou, como se ele esperasse de mim alguma resposta específica, que eu não sabia qual era.
- Já esteve na Itália?
Victor continuou me olhando, eu já estava ficando com medo, parecia que ele estava perscrutando a minha alma. Olhei desesperada pela sala, procurando por ajuda.
Então, eu o vi. Richard caminhava gloriosamente em minha direção, com um copo de café expresso em cada mão.
- A fila estava grande, por isso demorei tanto, mas consegui trazer seu cappucinno.- A voz dele era calma e confiante, ele me estendeu um dos copos.
- Esta tudo bem, querida?
- Claro... – Tentei parecer natural.
Ele encarou Victor, os olhos faiscando, uma linha de preocupação se formou em sua testa, desfazendo a harmonia do perfeito rosto angelical.
Uma voz feminina soou pelos alto-falantes do aeroporto, anunciando a partida de um vôo para Roma. Victor se pôs em pé.
- Bem, infelizmente meu vôo vai partir em breve. Foi um prazer vê-la e espero sinceramente reencontrá-la em breve, senhorita.
Fiquei em pé, e meu salvador postou-se ao meu lado, protetor.
- Faça uma boa viagem, senhor.
- Obrigado. – Apesar da aparência calma, Victor mantinha os punhos cerrados obviamente irritado pela interrupção, deu-nos as costas misturando-se à multidão do aeroporto.
Enquanto meu anjo ficava olhando Victor se afastar, fiquei observando-o, de perto era ainda mais perfeito: sua pele era pálida, quase como um mármore delicado mas com a textura de uma pétala de flor. O rosto tinha uma expressão séria, preocupada, mesmo assim, ele parecia mais com o Davi de Michelangelo, em todo seu esplendor. Ele se voltou em minha direção, e eu vislumbrei a incrível simetria de seu rosto, coroada pelos olhos dourados, cobertos de cílios espessos.
Por um momento, ele não falou nada. Foi aí que eu me dei conta que deveria estar parecendo uma idiota.
- Obrigada pela ajuda.
- Você deveria escolher melhor suas companhias.
- Vou me lembrar disso. – Consegui dizer num sussurro, quando senti o hálito inebriante dele, uma essência doce com um fundo amadeirado, masculino.
- Não vi você no desembarque...
- Acho que acabamos nos desencontrando. Eu não quis acordá-la, você parecia tão tranqüila dormindo que não achei justo despertá-la. – Ele sorriu. Incrível o poder que seu sorriso tinha, era devastador, capaz de tirar o planeta Terra do eixo... ou de me deixar tonta.
Ouvi a chamada para o meu vôo, justo agora, que tudo ia tão bem!
- É o meu vôo...
- Tente não se meter em apuros até chegar em casa, ok?
Meu coração acelerou e senti as palavras me faltarem. O que estava havendo comigo?
- Hum, é... Obrigada, Richard.
- Boa viagem, Lara.
Eu nunca seria capaz de esquecer seu timbre... A maneira como ele disse o meu nome... A voz de tenor aveludada ainda soava em meus ouvidos, quando embarquei no avião.
5. A Chegada
Eu sabia que alguém viria me buscar, provavelmente Carlos, motorista de meu pai.
Olhei e, em meio à pequena multidão do aeroporto, se é que eu podia dizer assim, estava Carlos: um homem negro, cerca de 50 anos, com seu impecável terno e quepe de motorista. Quando me viu, abriu um sorriso enorme e acenou.
- Srta. Lara! Há quanto tempo!
Carlos tirou imediatamente o quepe e me deu um aperto de mão firme, retirando a mochila de minhas costas.
- Obrigada, Carlos. Pode deixar, eu levo a mochila...
- Este é o meu trabalho, senhorita. Fez boa viagem?
- Sim, eu acabei dormindo, nem vi o tempo passar. – Senti meu rosto queimar - E meu pai?
- Ele ainda está no hospital, mas deve estar em casa mais tarde.
Ele abriu a porta do carro, um Mercedes preto, enorme, enquanto eu morria de vergonha: enquanto todos os outros passageiro pegavam seus táxis, como pessoas normais, eu era levada pelo motorista, como uma criança, mas nem pude protestar, já que meu pai nunca deixaria que eu fosse de táxi...
Saímos da região mais movimentada da pequena Alvorada por uma estrada menor, e depois pegamos outra estrada secundária, por uma hora, até a propriedade onde ficava nossa casa, a Mansão Grace, nome dado em homenagem à minha tataravó.
Nossa casa era grande e antiga, meu tataravô trouxe o projeto de uma antiga propriedade da família na Europa. Tem um estilo clássico, com imponentes colunas na entrada e janelas grandes em forma de arco, ninguém se cansa de elogiá-la quando a vê pela primeira vez. Eu acho que ela é grande demais: cinco quartos, sala de estar, biblioteca (incluindo um piano de cauda...), além de uma cozinha enorme, com todo tipo de coisas que um bom cheff possa imaginar. Quando minha mãe era viva, organizava jantares beneficentes, e a casa ficava cheia de convidados, com muita música, eu adorava. Hoje, não fazemos mais reuniões assim.
A propriedade era enorme, incluía uma boa parte de mata da região, a divisa com os vizinhos ao norte era um rio e ao sul também, pois o rio fazia uma volta na parte oeste do terreno.
Ao sul ficava a pequena vila onde morava a família de Carlos e Nana, um total de quase 40 pessoas, que viviam do turismo ecológico, do trabalho de escultura com pedras retiradas do rio Sta. Lúcia, mas a maioria trabalhava na empresa de mineração de meu avô.
Ao norte havia uma casa, que ficou por muito tempo desabitada, há uns três anos uma família estava morando lá, mas eu nunca os tinha visto, pois eu só vinha nas férias. Assim, os vizinhos mais próximos estavam a uns cinco quilômetros.
Carlos me levou até a entrada principal, onde Diná (para mim sempre foi Nana) estava nos esperando. Vestia seu uniforme, vestido preto e avental branco, impecavelmente passado, os cabelos escuros presos no coque elegante de sempre, o sorriso acolhedor de sempre emoldurado no rosto de feições indígenas . Nana e Carlos são casados e trabalham em nossa casa desde que meus pais casaram, então já são considerados mais como membros da família do que empregados.
- Lara, que saudades!
- Oi, Nana!
Nana me abraçou, como se fizessem séculos que eu estava fora e não apenas seis meses.
- Venha, eu já preparei seu jantar, fiz tudo que você gosta. Mas acho que você vai querer tomar banho primeiro...
Ela tagarelava sem parar, enquanto atravessávamos a sala de estar, com os mesmos móveis clássicos de sempre, e subíamos as escadas em direção ao meu quarto. Nana parou em frente à porta do meu quarto.
- Seu pai preparou uma surpresa para você. Ele queria muito estar aqui, mas você sabe como ele é ocupado...
Ela abriu a porta e eu vi o meu quarto completamente diferente. Paredes pintadas de lilás, uma cama enorme, televisão de plasma, mesa de estudos com um computador, um closet enorme e até o banheiro estava diferente, com uma banheira de hidromassagem.
- Espero que goste... Você nem sabe como seu pai estava contente por ter você em casa depois de tanto tempo! Ele quer muito que você goste de morar aqui novamente.
- Eu gostei... Muito. Eu só não esperava tudo isso! – E não esperava mesmo, antes, meu quarto era o típico cômodo de crianças, as paredes pintadas de rosa-bebê e decoradas com bailarinas e notas musicais e uma estante cheia de bonecas, dos tipos mais variados.
- Eu já arrumei suas coisas no closet, então, você pode descansar.
- Obrigada, Nana.
Ela me deixou sozinha e eu aproveitei para tomar um bom banho. Quando já estava me vestindo, ela chegou, trazendo meu jantar numa bandeja.
- Eu achei que meu pai vinha para o jantar...
- Ele ligou avisando que está numa cirurgia. Infelizmente não vai poder jantar com você.
- Ah, tudo bem... Eu sei que ele é ocupado.
- Eu vou deixar o seu jantar aqui... – ela já começava a olhar com pena, como se eu fosse um cãozinho abandonado. Não gosto disso, que sintam pena só porque minha mãe morreu e meu pai é um homem ocupado. Conheci muita gente como eu no internato, e sei que é difícil, mas posso viver sem sentir pena de mim mesma ou deixar que outros sintam isso por mim.
- Nana, está tudo bem. Eu estou cansada e tenho certeza que assim que terminar de comer vou cair na cama e dormir. Você pode ir para casa, sei que você tem família, não quero que chegue tarde.
- Tem certeza? Eu posso ficar aqui com você mais um pouco, não quero te deixar aqui sozinha...
- Eu vou ficar bem, de verdade.
- Boa noite, querida.
- Boa noite Nana.
Devorei o jantar em poucos minutos. Deixei a bandeja em cima do criado mudo e antes de adormecer completamente escutei uivos, mas eu estava tão cansada que logo dormi um sono pesado com os pesadelos de sempre, envolvendo minha mãe e vultos em capas pretas.
Quando acordei ainda era cedo, meu relógio de pulso marcava sete e meia. Demorei alguns minutos para lembrar onde estava. Meu pijama estava ensopado de suor, notei que havia um cobertor sobre mim e não foi difícil concluir que meu pai havia passado por ali para me desejar boa noite.
Vesti meu jeans, tênis uma camisa preta e um moletom leve, lá fora não parecia estar muito frio.
O reflexo do espelho mostrava uma adolescente com cabelos castanhos arrepiados, já que eu tinha dormido com eles molhados, meus cachos teimavam em aparecer e fiz o melhor que pude, dando umas boas escovadas para que eles se desmanchassem. Não funcionou: meu cabelo ainda ficou ondulado.
Escutei um passarinho cantando na sacada do quarto, e decidi abri-la e ver o meu primeiro amigo na cidade.
- Oi, passarinho, bom dia para você também. – era um passarinho comum, um pardal marrom. Ele olhava cheio de curiosidade, amparado na grande árvore cujos galhos chegavam até a sacada.
Desci as escadas e fui para a cozinha, onde Nana já preparava um café da manhã enorme.
- Bom dia Nana.
- Bom dia, pequena. – ela sempre me chamava assim.
- Seu pai está te esperando na varanda.
- Obrigada.
Fui até a varanda nos fundos, e ele estava lá, lendo seu jornal.
- Bom dia, pai.
- Bom dia Lara. – ele me beijou na testa. Já estava vestido para o trabalho, seu cabelo louro tinha mais fios brancos do que da última vez em que eu o havia visto. Havia mudado o corte de cabelo também, estava bem mais curto, me fazia lembrar o estilo dos soldados.
- Então, gostou da decoração?
- Sim, ficou muito bonito, obrigada.
Ele ficou me olhando e não nos falamos por alguns momentos. Seu semblante estava triste. Servi uma xícara de leite e comi um pãozinho.
- Falei com o diretor ontem, ele está muito impressionado com suas notas. Ele está ansioso para ver como você vai se sair.
- Mesmo? – No internato era tão normal que todos tirassem dez que eu já não me impressionava com minhas notas altas. Todos morávamos num colégio interno, e estudar o tempo todo era normal.
- Vai trabalhar hoje, pai?
- Infelizmente, tenho uma cirurgia marcada para logo mais. O que está pensando em fazer hoje?
- Ainda não sei, acho que vou ler um livro.
- Bem, se sair de casa na direção do bosque, tente não se assustar com um bando de lobos por aí. Nunca atacaram ninguém, mas... Eu escutei uns uivos durante a noite.
- Eu vou tomar cuidado, pai.
Carlos chegou, informando que o carro estava pronto para ir.
- Você vai ficar bem? – Meu pai estava preocupado em me deixar sozinha.
- Vou estar ocupada, lendo.
Ele me deu um beijo na testa e prometeu que tentaria fazer com que a cirurgia fosse o mais breve possível. Mas eu sabia que as cirurgias poderiam demorar horas, uma vez que estando no hospital surgiriam outras e mais outras e o assim seria o dia inteiro.
Oiii. Clá. tudo bom com vc flor? :D
ResponderExcluirvc sabe que amo de paixão sua fanfic xD então.. encontrei um site super legal pra postagem de fanfics se chama Nyah aki o link :http://fanfiction.nyah.com.br/
Faz um cadastro é posta aí, tenho certeza que muita gente vai gostar de ler sua história :D.
Se tiver alguma duvida do site pode me add no msn que é: camilabellary@hotmail.com ou deixar um recado no meu perfil do site Nyah mesmo aqui o :http://fanfiction.nyah.com.br/caahsalvatore
Vai, faz um cadastro, espero que possamos conversar mais.
bjoos
Cah